16 de ago. de 2010

Um modo diferente de ver os números


Os números estão presentes em tudo, e todos nós lidamos com eles de maneira automática. Nossa sociedade considera os números apenas como uma ferramenta de organização; isto é o que aprendemos na escola. Lembro que, ao começar a aprender matemática quando criança, atribuía determinada personalidade a cada um dos números. Esta era minha maneira de defini-los e diferenciá-los, mas isso só durou até mais ou menos os seis anos de idade. Depois disso eu fui começando a ver os números como qualquer pessoa “normal” faria, ou seja, em termos de quantidade e orientação. Hoje percebo que minha tentativa de atribuir personalidades aos números era uma maneira de fugir da matemática, que eu considerava — e considero — de uma chatice extrema.
   Uns dez anos depois descobri a numerologia. Durante todo o período escolar a aritmética seguiu me apavorando como um trovão súbito em um céu azul brilhante. Os monstros de meus pesadelos tinham a forma de números, ou talvez os cálculos nos quais eles estavam envolvidos me parecessem aterrorizantes. A numerologia então desvelou a mim o aspecto onírico dos números, sua essência e traços originais, fazendo-me relembrar a pálida memória que tinha deles como “seres” quando criança. A numerologia funcionou como um ponto de mutação.
   Mesmo a numerologia sendo um instrumento eficiente para entender personalidade e existências, os números não são a numerologia em si. É isso que os estudantes de filosofias esotéricas nem sempre entendem, que os números são símbolos básicos para nossas mentes e almas, pois antecedem a tudo e todos, inclusive a todos estes cálculos nos quais os números são mais ou menos evidentes —  seja uma das técnicas esotéricas citadas acima ou uma das disciplinas cientificas como matemática, física, química etc.
   A numerologia — que deriva da cabala, sendo uma versão ocidental da gematria cabalística – me levou a ver os números de novo como energias distintas, quase como entidades, ainda que eu sempre tenha tido consciência de que os números não são seres de verdade, mas vibrações de arquétipos, ou seja, algo próximo da idéia de elementais, ainda que indo além dos quatro elementos ao sintetizar a vasta multiplicidade de fenômenos e seres. Tome os doze números básicos como arquétipos essenciais e comece a reparar como e quando eles aparecem no seu dia-a-dia, de maneira explicita ou implícita. É provável que você sinta despertar em si a consciência de uma voz silenciosa sussurrando mensagens através dos números, como se estes fossem a sinalização numa estrada. Tomar consciência dos símbolos contidos nos números é como abrir os ouvidos a uma nova língua, e fica mais fácil ver o mundo como um oráculo que tem sua base nos próprios números, ainda que inclua quaisquer outros elementos, pois os números são representações da totalidade das coisas e seres. Da mesma forma que as disciplinas cientificas não são um objetivo em si mesmas, mas uma forma de chegar a algo, nenhuma técnica esotérica deve ser tomada como objetivo final.
   Quando percebi isto, entendi o que uma amiga me disse tempos atrás sobre seus métodos divinatórios. Ela é uma mulher que estuda os mistérios femininos da bruxaria, e fiquei impressionado com sua resposta quando a perguntei se costumava usar algum oráculo: “Prefiro ler edifícios, pássaros e nuvens que ler cartas ou mapas”. Confesso que não entendi completamente a idéia na época, mas à medida que me aprofundei em experimentações com o universo dos números e suas conexões com planetas, cores, mitos, aromas, elementos etc., minha mente despertou para o fato de que todas as coisas são símbolos e oráculos em potencial, dependendo apenas da “moldura mental” do individuo. Assim, o primeiro edifício que vemos ao olhar pela janela possui uma cor, um formato, um certo número de janelas e vários detalhes que formarão uma idéia —  e esta idéia traz uma mensagem, a qual pode ser uma resposta para sua questão pessoal ou um conselho em momento de duvida. O mesmo se aplica a uma nuvem e seu formato, sugerindo uma serie de idéias, e assim por diante com todas as coisas no mundo.

   Os antigos alquimistas entendiam as alegorias nas quais as fórmulas eram escritas, mas para o homem médio são apenas palavras estranhas. O mesmo se dá com as ilustrações alquímicas, que registravam formulas sem usar palavras, apenas símbolos. Tomando-se os números como glifos, aprendemos a decifrar as formulas que trazem, e finalmente usar estas formulas para nosso próprio crescimento.
   Por exemplo, imagine que você está vivendo um momento de dúvida na vida. Você tem um trabalho estável há dez anos e aparece a chance de trabalhar em algo diferente. O desafio e a novidade lhe atraem, ainda que haja insegurança quanto a deixar o emprego ao qual você inevitavelmente se acostumou. Você então sai para uma caminhada, tentando clarear a mente e pensar no que fazer. Você vai passando pelos lugares sem prestar atenção em nada nem ninguém; na sua cabeça só há espaço para o seu dilema. Quando a dúvida chega o nível máximo, você chega a verbalizar baixinho: “o que eu vou fazer?”, e é então que, ainda caminhando pelas ruas, escuta a conversa de duas pessoas. Uma delas diz: “é número 11”. Observe que o mesmo processo poderia ocorrer de outra maneira, digamos, você poderia formular uma pergunta de maneira consciente e de repente perceber um número 11 em um edifício, casa, ou seja, o que for. Ou alguém usando uma camiseta com o número 11 cruza seu caminho. Ou mesmo ainda o sino da igreja toca 11 vezes. Uma criança diz nada tevê que tem 11 anos. Não importa como o número vem, o importante é o número em si, pois ele traz uma mensagem.
   Então cai a ficha. Você sente que, curiosamente, esta é a resposta para sua pergunta. O que fazer? É número 11. Se você sabe o que significa este número, ou seja, se você tem uma impressão sobre o mesmo, a coisa soará como uma mensagem. Neste caso, lembremos que o número 11 implica excesso, pois está além da perfeição e finalização de 10. Desta forma a mensagem começa a tomar corpo, sugerindo que a mudança de emprego seria melhor que manter uma condição de vida já estabelecida. Conclui-se que a sugestão é seguir adiante, então mudar de emprego seria melhor que manter uma condição de vida já estabelecida. Por outro lado, se o número fosse 4 ao invés de 11, a idéia seria continuar trabalhando no mesmo local —  uma mudança seria até mesmo arriscada, já que 4 é símbolo de estabilidade. Este mesmo princípio levou à criação do Oráculo dos Números, mas isso é assunto para outro post.
   Enfim, extrair impressões de coisas e formular uma mensagem tomando por base esse tipo de pensamento é algo próximo da superstição. Um dia um adepto de mente curta declarou que, sendo o triângulo a representação da divina trindade (a lei do triângulo), passar por debaixo de uma escada seria como adentrar o ser divino, Deus, o que seria então uma blasfêmia a ser punida pelo Criador com ondas de má sorte sobre o pecador. É assim que as superstições se formam. Porque cruzar a divindade —  passar por debaixo da escada —  seria algo necessariamente aziago? Para mim, pelo menos, adentrar a divindade seria equivalente a receber suas bênçãos.
   A coisa toda não é aleatória, ao contrario do que possa parecer de cara. Há uma interpretação correta para o significado de cada número. Não se pode simplesmente “achar” que um dado número tem uma certa característica e ponto. Os números são emanações vivas a serem pesquisadas, levando os estudantes a um ponto de convergência entre os símbolos numéricos na natureza, na matemática e na filosofia.  Portanto, se o número 7 é considerado introspectivo e observador, é precisamente devido a seu comportamento matemático, que indica tais características. O conceito de seu arquétipo é o resultado da observação de sua dificuldade em  co-operar com outros números na primeira década: para encontrar 7 como resultado de uma divisão, é necessário dividir 14 — que extrapola a década — por 2; além do que, o número 7 não deixa de quebrar a conexão do grupo em outros esquemas: [2 x 2 = 4;] e [3 x 3 = 9; 9 : 3 = 3); ou seja, todos os números da década participam de operações de divisão e multiplicação, com a exceção de 7. Se você observou bem, há de ter reparado que o número 1 também quebra esta corrente, mas 1 não é um número, mas o número original, a unidade — todos os outros números são desenvolvidos a partir de 1. Desta forma, entre os números arquetípicos que formam a década, 7 é o primeiro e o único a tentar a individualidade em seu sentido mais acurado — isolamento intencional em oposição à natural liderança de 1.

   Após brincar com os números através de cálculos e associação, suas personalidades aparecem claramente, e assim seu sentido se torna bastante compreensível, facilitando a conexão com nossas intuições mais elevadas e mais profundas. É uma experiência iluminadora, ainda que às vezes o desvelar da teia densa e invisível que nos envolve possa ser chocante para pessoas excessivamente presas a noções preconcebidas.
   Mesmo se você não tiver nenhuma atração em particular pelos números como símbolos, é possível entender a mensagem que eles sussurram ao associar números e planetas, mitos, oráculos, seja o que for. A mensagem do número 1 é sempre solar e masculina, enquanto 2 se apresenta como uma delicada gota lunar. O número 3 fala pela boca da criança, e 4 é o trabalho do operário. 5 é o impulso flamejante da mudança, 6 é a conservação emocional. O número 7 observa à distância e 8 é a emanação de Maat, deusa egípcia da justiça e da verdade. 9 se aproxima do excesso, mas apenas 11 completa o trabalho de alargar fronteiras. 22 é a parte mais transcendente da matéria. Claro que estas são apenas pequenas sugestões dos arquétipos dos números. O aprendizado sobre o que eles têm a transmitir é imenso, pois os números são simbolismo do começo, do fim e mesmo dos períodos antes do começo e depois do fim. O número 0 abarca qualquer pré ou pós-abstração. Como a árvore da vida cabalística representa muito bem, antes do mundo como o conhecemos não havia nada, ou seja, 0. O primeiro ser estava implícito neste nada, e quando veio a aparecer, continha em si o potencial de ser dividido, criando assim o número 2, que por sua vez se soma a 1 para gerar 3, e assim por diante.        
   Indo mais fundo nesta observação, vamos pensar sobre nossa sociedade e o modo que ela reflete sua atmosfera em números oficiais, como datas. A década de 60 está marcada na história como a época do “flower power”, do movimento paz-e-amor, da forte reação contra a guerra. 6 é o número do amor em si mesmo, não só o amor de amantes, mas da família, amor social — o número de Adonai, do Cristo/Buda interno, o anjo guardião. Os anos 70 trouxeram criticas ao sonho da geração “paz-e-amor”, mas foi também uma época na qual experiências com misticismo e esoterismo tomaram mais corpo, quando a juventude ocidental começou a buscar várias formas de manifestação espiritual, dando base ao fenômeno nascente da “new age”. Os anos 80, por outro lado, foram bastante materialistas; um período duro com o aparecimento da AIDS e a atmosfera de guerra fria. As causas e efeitos das décadas anteriores se cristalizaram nesta década. Nos anos 90 havia uma sensação de libertação e também os saltos tecnológicos, ainda que houvesse também muito stress, dada a urgência e pressa do número 9. Agora estamos terminando de viver a primeira década do século 21, um período marcado pelo 0, ou seja, sinal de “começar do zero”, repaginar, recomeçar, zerar tudo. Sem dúvida nosso mundo está criando novos paradigmas e vários conceitos arraigados há muitos séculos estão sendo derrubados rapidamente.
   Não devemos esquecer que as classificações numéricas de ano, mês etc., são puramente arbitrárias. Não estamos efetivamente vivendo no ano 2012, como se sabe.  Mas isso não invalida o fato de que convenções numéricas como estas refletem a organização coletiva de nosso tempo, e são a base sobre qual se pode analisar um mapa e, mais ainda, entender o mundo como sendo o oráculo de cada individuo, e os números como seus principais glifos.

Texto de Johann Heyss. Não reproduza sem mencionar o autor e o blog.

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